Sempre tirei um bom proveito das redes sociais em das quais
participei. Acesso a informações, diversão, conhecimento... Todos os regalos
que agradam um espírito faminto de informações, curiosidades e trilhas para
seguir como o meu. Apesar de sua gênese se dar no meio virtual, de seu ambiente
ser o recente (historicamente falando) mundo da informática, as redes sociais
não são diferentes de outras interações humanas. Por trás de todas as placas,
teclados, monitores, conexões, discos rígidos, web sites e servidores, ainda
somos nós lá. Interagindo mal e porcamente, como fazemos desde que descemos das
árvores, com poucos momentos de melhora no desempenho de nossas interações.
Seria ilusão nossa acreditar que não existiam trolls, que naquela época deviam
ser conhecidos por espíritos de porco (ou algo que o valha) nas assembléias da
Grécia clássica. Quiçá desde o tempo das cavernas. Sabendo disso, poucas vezes
me indispus ou se indispuseram comigo nesses anos de convívio virtual nas
redes.
Hoje, mesmo depois de tanto tempo, me surpreendi um pouco.
Infelizmente, para mal. Tinha adicionado em uma dessas redes um senhor gaúcho,
escritor com exímio domínio da língua portuguesa, por quem eu tinha bastante
admiração. Não o conhecia profundamente, mas procurava ler sempre que podia
seus escritos e deles absorver o máximo de informação. Em nossa etérea
convivência virtual, percebi algumas vezes certa rabugice com relação a certos
assuntos, mas nada que comprometesse a fundo minha admiração por suas
qualidades, que já descrevi. Eis que em uma de nossas trocas de mensagens,
percebi em seu discurso certo ranço, certa insistência fazer uma demonização
extrema da influência americana nos eventos que levaram ao golpe militar de
1964. Apesar de ter lido sobre e conhecer alguns detalhes sobre essa
influência, e sobre a política americana para a América Latina naquele período,
na época da citada conversa dei pouca atenção a isto, pois foi uma nuance de
opinião que apareceu de forma lateral na discussão de outro assunto. Mas ficou
registrada essa insistência teimosa, coisa que não combinava muito bem com uma
pessoa de quem se depreendia uma inteligência mais ponderada, menos extremista
ou não tão dada a simplismos maniqueístas.
Em uma troca de comentários, dei uma opinião sobre o que
chamei simbolicamente de “DNA do Brasil”. Afirmei simbolicamente que o
brasileiro, (enquanto resultado de uma soma, e não como indivíduo) possuía
características que eram muito presentes e perenes, desde o período da colônia,
durante o império, república, ditadura militar, e até hoje, que pouco mudaram.
Afirmei que pouco foi feito ou estimulado por quem quer que estivesse no poder
durante nesses quinhentos e tantos anos para que essas características quando
boas, sobressaíssem e quando ruins, fossem trabalhadas no intuito de melhorar.
O velho senhor (que aparentemente se esforçava para destruir a boa imagem que
tinha aos meus olhos), procurou encurralar-me em meus argumentos, afirmando que
minha falta de estudo histórico (decidida por ele como líquida e certa através
do simples fato de eu não concordar com seus argumentos) impedia que eu
continuasse uma conversa, que eu deveria estudar mais a história de nosso país.
Montado em um desespero eqüino para tentar derrubar meus argumentos, que
apresentei com a máxima serenidade, tornou-se monocórdio em suas afirmações.
Arvorou-se em uma empáfia desmesurada e vazia baseada na repetição “do quanto
ele estudou na vida”, e chegou ao ponto ridículo de acusar-me de racismo contra
os negros. Isso por eu mencionar a valorização que o brasileiro dá àquela
famosa e macunaímica dose de malemolência, preguiça e “malandragem inocente”
como algo que sempre foi valioso para os poderosos no sentido de manter o povo
dócil, avesso ao progresso pessoal e à consciência de mobilização. Vi naquele
senhor brados por um patriotismo realmente senil, que destoava de seus textos
tão lúcidos. Li em seus comentários (cada vez mais absurdos) sugestões de que o
ufanismo cego é a saída, de que a mais profunda negação de valores universais é
a solução e de que aparentemente, só abraçando como se fossem qualidades todos
os nossos mais vergonhosos defeitos, estaríamos no caminho certo. Desisti.
Procurei defender-me com retidão da injusta acusação de
racismo, tratei de pilhá-lo por ter tentado comigo um artifício de argumentação
tão basal, e procurei uma oportunidade para dar a discussão por encerrada.
Antes disso, meu antes prezado interlocutor ainda teve tempo de dirigir-me
algumas linhas malcriadas e recomendar-me que fosse estudar mais e passasse
bem. Fui obrigado a finalizar minha participação nessa infrutífera discussão
confessando que se fosse para chegar ao fim de minha vida um velho rabugento,
monocórdio, de mente empedernida e com idéias tão bolorentas e pouco
imaginativas quanto aquelas que ele tinha me apresentado ali, preferia estudar
outras coisas. No fim, achei o saldo positivo. Pude exercitar meus argumentos
em uma discussão até certo ponto de bom nível. Pude sentir-me mais seguro de
que a temperança é um caminho bem melhor que o extremismo. Pude reafirmar minha
desconfiança de que o avançar dos anos não traz a mesma carga de sabedoria a
todos nós. E pude arrumar assunto para escrever mais um texto, exercitar e
procurar chegar um dia em que escreva tão bem quanto o velho lá, só que com a
mente mais aberta. Lembrei que sempre gostei muito de todos os velhos com que convivi. Mas também lembrei que sempre demonstrei uma enorme insatisfação com velhos mal-educados. Espero apenas que quando eu chegar lá, a dupla Seu Alzheimer e Dona
Esclerose mantenha-se longe dos meus queridos neurônios, pois estando lúcido, ao menos um velho educado eu garanto que serei.
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